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sábado, 7 de fevereiro de 2015

CONTRASTES EM ALTO MAR

Havia, em números arredondados, 900 alemães e 800 brasileiros.  Os demais eram de outras nacionalidades. Viajavam juntos num navio que ia do Brasil para a Itália. Dezenove dias de viagem, de experiências interessantes sobre diferenças culturais entre alemães e brasileiros. E entre os brasileiros, conforme a região do País. O preço convidativo e o parcelamento facilitado animaram muitos brasileiros a embarcarem na ideia da viagem.

Nos elevadores do navio, as portas se abriam. Os alegres brasileiros, alguns de roupas multicoloridas, já entravam desejando um sincero bom dia. Os alemães, de cara amarrada, mudos, nem balançavam a cabeça.  Quem sabe um  "Good Morning!"?. Nada.  Os brasileiros se espremiam para caber mais um, respeitando a quantidade máxima permitida. Os alemães não se mexiam um milímetro.  Incomodavam-se com a conversa descontraída e barulhenta dos brasileiros.

Curiosidades:

- nos desembarques nos diversos portos, os brasileiros se organizavam em filas. Os alemães chegavam e entravam onde achavam melhor. Os brasileiros os mandavam para o final da fila, eles não entendiam. Achavam normal. Nos elevadores também. A hora que a porta abria corriam para o "embarque" sem observar quem estava na frente. 

- como havia uma população grande de brasileiros clientes da mesma empresa de turismo, ela lhes conseguia algumas regalias, como ter missa semanalmente (levavam um padre junto), reza de terço às terças-feiras, músicos de axé na beira da piscina, desembarque todos juntos, dançarinos para as mulheres desacompanhadas, etc. Eram facilmente reconhecidos pela roupa, pela alegria, descontração, pela fala alta, pela maneira com que chamavam e tratavam os garçons.

- no restaurante que tinha bufê, na hora do almoço, era comum ver pratos abarrotados de comida abandonados nas mesas de brasileiros. A comida ia pro lixo. Os germânicos eram criteriosos. Punham no prato só o que iam comer. Postura ética e cristã.

- no jantar, com cardápio, numa mesa de brasileiros, a senhora de roupas coloridas e maquiagem saliente fala alto com o garçom, empurra o prato que ela havia pedido e diz: "Eu não como isso!". Reclama  da comida quase aos berros, apoiada no sorriso dos outros sete comensais da mesa. Os vizinhos  olham, o garçom fica vermelho, recolhe o prato e pede pra ela escolher outro. Na missa semanal privada e, depois, na reza do terço, a humilhação dada aos serviçais nem é lembrada. Na confissão para receber a hóstia, isso não é considerado. Afinal, garçom é pra servir.

- nas mesas de alemães, silêncio, falam pouco e em volume baixo. Chamam o garçom discretamente.

- depois do jantar, teatro. Os artistas apresentam sua arte com cantos, danças, concertos de piano. Na plateia ouvem-se conversas altas (em português), risadas ruidosas, um senta-levanta constante.

-  à pergunta sobre de qual nacionalidade as pessoas dão mais trabalho aos serviçais, respondem: brasileiros. Os alemães são secos, mas não agridem, são respeitosos. Brasileiro é alegre, descontraído, mas humilha.

A boa situação econômica do Brasil diante dos europeus nos tornou turistas desejados, mas a possibilidade de ter um padrão de vida melhor fez, em muitos, a arrogância subir à cabeça. E a Síndrome de Estocolmo acontece.

Conversando com dois europeus, um trabalhando na Itália, outro na Suíça, ambos afirmam adorar o nosso país. Estiveram por aqui e gostaram muito do jeito brasileiro de ser: informal, alegre, receptivo. O da Itália disse que gostaria que o filho fosse criado no Brasil. Fazia de tudo pra conseguir isso. O da Suíça, um português, estava aguardando a aposentadoria.  Assim que a obtivesse viria morar aqui.

Claro, não se pode generalizar. Não é todo brasileiro ou alemão que é assim ou assado. Apenas uma amostra de alguns, numa situação específica. Mas tudo está intimamente ligado à cultura do seu país. Para alguns deste lindo país tropical, o mais insignificante é outro brasileiro.

Temos muito a ensinar e muito a aprender.

No jornal: http://www.ilustrado.com.br/jornal/ExibeNoticia.aspx?NotID=63749&Not=Contrastes%20em%20alto%20mar


angeloroman@terra.com.br          -     

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