Nas eleições americanas, o Facebook, pelos milhões de
dados que tem dos usuários, traçou um mapa de gosto musical em função da
orientação política da população. Baseado, portanto, em dados concretos.
Beatles, Pink Floyd, Bob Marley, por exemplo, têm preferência nos eleitores
democratas. Lynyrd Skyrnyd, George Strait, Ted Nugent, dos republicanos. Preferência
dos dois: Elvis, Bon Jovi, AC/DC.
No Brasil seria flagrante a diferença de gostos musicais,
em função das preferências ou convicções políticas. Principalmente das
convicções.
Há quem afirme que música não é apenas um gosto, mas ela
retrata o nível cultural e atitude na vida da pessoa. Talvez possamos dizer que
as músicas atemporais, que não são modismos, são as de qualidade. Elas
permanecem. As da moda entram e saem rapidamente. As gravadoras determinam o
que vai ser sucesso e por quanto tempo. Analogia: a mídia determina o que a
população deve criticar, contra o que deve fazer manifestação, o que deve
pensar, sem qualquer reflexão. Pior: em ambos os casos, as pessoas acham que é
opção delas próprias.
A anulação do senso crítico musical anula também o senso
crítico do nosso dia a dia? Com o “eu quero tchu, eu quero
tcha, eu quero tchu tchá tchu tchá tchu tchá!” elegem-se Justus, Romanelli,
Ratinho e demais membros da Bancada do Camburão no Paraná, Maluf, Richa, Cunha,
Calheiros, etc.? O “É nóis fazer
parapapá, parapapá, parapapá, garrar, beijar, fazer parapapá” reelege esses
políticos? Uns acham que sim. Vide o levantamento do Facebook. Outros acham que
não tem a ver.
Esses levantamentos
explicam a ocorrência de frequência de eventos. Não são absolutos. Assim, há
pessoas com senso crítico baixo com relação a questões políticas, mas com gosto
musical muito além dos modismos. A recíproca já é mais difícil, mas acontece.
Olhei algumas letras
das 100 músicas mais ouvidas pelo Spotify em Curitiba. Vi um vídeo também. Os
cantores fazem movimentos eróticos com os quadris. Na hora do “vem, vem, vem, vem,
vem” os movimentos continuam, com a mão simulando uma masturbação. As meninas,
bem vestidas e maquiadas, pulam e gritam.
As letras são
machistas: “A mulherada louca já
perderam(sic) a noção, traga meia dúzia de pinga com limão”, “Hoje é só farra,
pinga e foguete”, “Ela
vira um grude nem dá pra arrumar uma briga. Não vai ter jeito de levar ninguém
pra cama. Mas dá vontade de um `trenzinho´ diferente”, “Me
vê com outra, beijando na boca. Foi barraco aquele rolo, lavação de roupa”,
“Ela é maluca, é linda e sabe que é gostosa. É superpoderosa, ela sabe que leva qualquer homem pra cama (depois sugere que ela leve 5 amigas para um
encontro)”, “Eu não dou mole não, eu
jogo ela nos meus braços. Grudo ela no peito e tá feito um regaço”, “Foi pra
noite, perdeu a linha. Solteira de carteirinha”, “Agarrei no seu cabelo e te
dei um abraço. E falei baixinho no seu ouvidinho. Vamos lá pra casa que eu faço
gostosinho”. Machismo puro, mulher-objeto. A galera feminina delira. Se os
jovens ouvissem apenas em festas, pra dançar, ainda vá, junto com axés de dança
da bundinha, da galinha, da poeira... Mas ouvem no dia a dia.
Nas baladas, a música
é altíssima. Dúvida que tenho: a música é tocada tão alta, justamente porque as
pessoas não têm o que conversar? Ou não conversam porque a música é alta? Como
conseguem combinar um encontro pra se conhecerem melhor (além da imagem física)?
Com mímica?
Tanta luta das
mulheres de anos atrás para se livrarem do machismo, do preconceito, da
submissão forçada. As moçoilas estão jogando isso no lixo: submissão
consentida.
Meses atrás, participei
de uma festa de confraternização. A música não era tão ruim (pelo meu
gosto pessoal), mas o volume, insuportável. Impossível conversar. E era uma confraternização!
O professor Vladimir
Safatle citou palavras de Marx num artigo: “A situação desesperadora da época em
que vivo me enche de esperança”. Na
suposição de que situações aparentemente sem saída são apenas expressão de que
finalmente podemos começar a nos livrar dos entulhos de nosso tempo.
Também, e principalmente, no campo político.
Música pode explicar
muita coisa. O Facebook que o diga.
Tomara que Marx esteja
certo.
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