Fui ao barbeiro
cortar o cabelo. Ele contou uma história acontecida na semana, em frente à
barbearia, num ponto de ônibus.
Dois sujeitos
conversavam sobre assaltar um supermercado próximo. Alto, todos ouvindo. Um dos
ouvintes era um policial a paisana. O barbeiro fez questão de falar o nome do
policial, orgulhoso por conhecê-lo. Ao ouvir falar sobre o suposto assalto, o
policial sacou a arma e apontou-a para um dos “assaltantes”. O sujeito correu, o policial atirou e o
baleado caiu no meio da rua, com dois tiros nas costas. O policial se
aproximou, todos vendo, mirou na cabeça do homem deitado e atirou. Nessa hora,
o barbeiro parou de cortar meu cabelo e mostrou como o policial fez. Perguntei
sobre o outro suposto assaltante. Me respondeu que o outro havia ido a um
terreno vizinho urinar e, quando viu o amigo
baleado, gritou “Não me mate, não me mate!”. Esse só levou uma camaçada
de pau.
Que história mais
inverossímil! Atirar em alguém por causa da tal conversa. Bem, o policial foi
aplaudido. Eu me indignei com isso, quando um cliente que estava esperando a
vez contou outra história.
No dia anterior
tinha ido pegar um filho, de 18 anos, que o esperava no Batel, aonde havia ido pegar
um material para seu curso na Federal. Chegando, viu ao longe o filho encostado
numa parede, pernas abertas, mãos para cima. Um dos policiais o revistava. O
outro estava com um revólver encostado
na cabeça do garoto. O pai ficou desesperado, e apenas pôde ver os policiais
terminando o “serviço” e indo embora. Não deu nem pra falar com eles. O filho,
resignado, apenas disse que isso acontece sempre. Ele tem a pele amorenada. Não
é incomum uma arma nessa situação disparar.
Voltando pra
casa, li sobre a abordagem policial a três músicos (dois negros e um branco)
que cantavam num ônibus, aqui em Curitiba. “Foram
algemados [os negros], humilhados e tratados com uma violência descomunal, com
choques elétricos e todo o arsenal de crueldade, prática comum quando se trata
de lidar com os mais pobres. Tudo isso contra jovens que cometeram o terrível
crime de tocar suas músicas dentro de um ônibus (muito aplaudidos pelos
usuários do transporte, inclusive).” O branco, que portava “a arma do crime” (um
violão), foi ignorado. Teve que dizer que estava com os outros para ir junto à
delegacia.
Me
lembro de vários casos de abordagem policial a jovens inocentes (filhos de
conhecidos meus morreram assim), que resultam em morte “acidental”, ou
“pensamos que ia sacar uma arma”, “estava armado”, “apenas nos defendemos”,
etc. E a coisa está piorando. Por quê? Porque não há punição, e, pelo aplauso
da população favorável ao “bandido bom é bandido morto”, como no caso narrado pelo
barbeiro. Avalizam isso também os raivosos que saem em manifestações xingando,
agredindo fisicamente quem pensa diferente ou usa uma camiseta de cor
“suspeita”. Hoje, o suposto ladrão no
ponto de ônibus. Amanhã, nossos filhos, nossos vizinhos, voltando da faculdade
ou do trabalho.
Só
nós podemos mudar isso. Temos um judiciário de alto escalão que protege os
poderosos. Isso também é violência. Temos uma Assembleia de baixíssimo nível, a
exemplo do Congresso, mas pior. Políticos corruptos são reeleitos, polícia bate
em professores por ordem superior, agride cidadãos.
Como
mudar? Parar de seguir ordens de sair às ruas com o monocórdio impeachment e
direcionar para o que realmente nos consome. Felizmente, boa parte está
acordando para isso. Os manifestantes seguem como cordeiros um adolescente
descocado (que tem pauta danosa, desconhecida por eles) e uma imprensa a serviço
de pessoas perniciosas. Um dos homens mais corruptos do Brasil, Eduardo Cunha,
é poupado e até elogiado. Dilma mostrou-se incompetente, não corrupta. Até
políticos de baixo nível do PSDB e DEM reconhecem a integridade dela. Por que
preservar Cunha? Alguém se revoltou com o STF ter adiado para fevereiro o
julgamento do pedido legítimo de afastamento do capo? Os nobres ministros não poderiam ter adiado suas longas
férias por um ou dois dias para resolver algo que está paralisando o País?
Houve
três recursos no STF sobre os procedimentos adotados por Cunha. Um caiu nas
mãos de Gilmar Mendes. Indeferido. Outro, na caneta de Celso de Melo.
Engavetado. Outro, para Fachin, que acolheu e pediu manifestação da
Procuradoria Geral, para a Câmara dos deputados.... Estudou o assunto, relatou
o processo e pôs pra julgamento. Exposto o relatório, a imprensa e os
comentaristas “políticos” (até cineasta fracassado é comentarista político)
elogiaram o relatório. Concorde-se ou não com Fachin, ele não engavetou. Estudou
e tomou uma posição. O relatório foi contestado em quatro pontos por contrariar
decisões já tomadas pelo mesmo STF por ocasião do impeachment de Collor. Fachin foi massacrado pelos monomaníacos de
sempre quando foi escolhido para ministro, por “ser Dilmista”. Quando fez o
relatório, virou herói. Quando foram contestados os quatro pontos, virou
herói-vítima. E esse povo vota!
Aos
grandes bandidos de paletó e gravata não se pede a morte. São até idolatrados.
Quando vão à Justiça normalmente é por iniciativa de outros países. Mas daí
acontecem os típicos engavetamentos. Mais uma seletividade danosa.
Sofremos
violência de todos os lados. Em todos os níveis. Se tivéssemos um Judiciário melhor, tudo seria diferente. Nele
reside o problema.
Os
autodenominados “homens de bem” são um perigo. No Facebook eles põem as ideias
que lhes impuseram e acreditam serem suas, afirmando que os “homens de bem”
pensam daquele jeito. E agridem quem pensa diferente.
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