“Ele escala o Ministério, eu escalo a Seleção”.
Essa frase selou a carreira de João
Saldanha como técnico da Seleção Brasileira de Futebol, em 1970. Foi demitido.
Faltavam três meses para a Copa no México. O presidente Garrastazu Médici pediu
a convocação de Dario, o Dadá Maravilha. Saldanha (chamado de João-Sem-Medo por
Nelson Rodrigues) tinha personalidade forte e jamais se dobrava. Soltou a frase
acima... e perdeu o emprego. Não era pedido. Era ordem. Voltou para o
jornalismo. Eu gostava muito de ouvir seus comentários na TV e ler seus artigos
nos jornais.
Um sortudo substituiu João Saldanha
na Seleção: Zagallo. Pegou uma equipe prontinha, entrosada, que havia
conquistado vaga na Copa ganhando todos os jogos eliminatórios. Agora Médici
foi obedecido e Dadá foi convocado. O presidente mandou convocar pra seleção,
mas, parece, não exigiu que entrasse em campo. Dadá ficou na reserva. Ele é o
único caso de jogador ser convocado pelo Presidente da República. Brasil foi
campeão com a seleção montada e esquematizada por Saldanha. Mas a sorte de Zagallo começou em 1958,
em sua primeira Copa. Ele era reserva de Pepe, que se contundiu pouco antes do
certame. Zagallo aproveitou a sorte da contusão do titular e jogou bem, o que
lhe garantiu a convocação para 1962. Zagallo: bicampeão. Depois, tri, graças ao
Médici e ao Saldanha. Voltou à seleção em 1994. Mas o técnico era o Parreira.
Zagallo, auxiliar técnico. Brasil ganhou. Zagallo (?).... tetracampeão.
O único tetracampeão do mundo foi
muito beneficiado pela sorte. As únicas vezes em que o sucesso dependeu dele,
na Seleção, foram nas Copas de 1974 e 1998. Brasil perdeu as duas. Disse ele em
1974, antes de apanhar da Holanda: “O time deles é bom, mas os holandeses não
têm tradição em Copas e isso pesa. A Holanda não me preocupa." Em 1998:
"Ninguém tira essa Copa do Mundo do Brasil. Eu, Zagallo, tenho a certeza
de que o Brasil vai ganhar da França." Outra dele: "Se eu fosse
técnico da Noruega, ela já estaria na próxima fase da Copa." Depois que o
Brasil perdeu da Noruega: "A Copa começa no jogo contra o Chile." De
bravata em bravata, o Brasil foi pro brejo.
A arrogância não o deixou ver que seu
maior talento era ter sorte. Sem Médici, sem Saldanha, sem Pepe machucado, sem
Parreira, adiantava rezar? Só gogó não dava. Não se pode, claro, contar só com
a força invencível do destino. É preciso alguma competência. Sem dúvida,
Zagallo, mesmo beneficiado pela sorte, jogou bem em 1958 e 1962. Não se pode
dizer o mesmo como técnico. Teve duas oportunidades: 1974 e 1998. Não deu. Nas
outras, tinha suporte. Ele tinha razão quando disse: “Vocês vão ter que me
engolir”.
Zagallo é um exemplo que vem à tona
em época de Copa. Quando morrer, vai virar herói. Há muitos outros casos de
sortudos. Li uma jornalista, tempos atrás, que considerava sortudos o Ringo
Starr, ao se tornar baterista dos Beatles e Itamar Franco ao se tornar
presidente. Pode-se acrescentar Sarney, beneficiado com a morte de Tancredo
Neves. Sarney dispensa comentários. Já Itamar foi um bom presidente, não se
vendia. Queria marcar seu governo com o fim da inflação descontrolada que
havia. Era seu grande objetivo. E conseguiu. Faltou-lhe sorte no mérito de ter
estabilizado a economia e implantado o Plano Real. A glória ficou para FHC, seu
sortudo Ministro da Fazenda por 10 meses. Goebbels sempre atual.
Rubens Ricúpero, ministro que
substituiu FHC disse: "Por razões político-partidárias, resolveu-se dar a
Fernando Henrique Cardoso todo o crédito e a paternidade pelo real, o que não é
correto".
São pessoas que por acaso estavam no
lugar certo na hora certa.
Ângelo
Edval Roman angeloroman@terra.com.br -27.07.14
http://www.ilustrado.com.br/jornal/ExibeNoticia.aspx?NotID=58157&Not=Sorte%20de%20uns,%20azar%20de%20outros